sábado, 11 de junho de 2016

HÁ 10 MIL ANOS ATRÁS

Há 10 Mil Anos Atrás


Como eu poderia começar a falar de 1976, onde acho que tudo teve início, a não ser por Raul Seixas e seu clássico "Há 10 mil anos atrás"?



Isso mesmo, sem querer me gabar, acho que o mundo, e a música, principalmente a música, começou em 1976. Nesta série de intenções críticas, tentarei demonstrar a veracidade deste pequeno vero devaneio.

E, ora, se começamos em 1976, começamos por causa de Raul, que já era muito vivo "há 10 mil anos".

Finíssima nata dos clássicos do Rock, este disco, o quinto da carreira solo do baiano Raulzito, sem os Panteras, veio salvar o futuro maluco beleza do fracasso do álbum lançado no ano anterior, "Novo Aeon", que, apesar de conter clássicos do Pop brasuca ("Tente Outra Vez", "Rock do Diabo",   "A Macã", a faixa título da obra e outros), não agradou à crítica e não vendeu o esperado, sobretudo depois do sucesso do primeiro album ("krig-Ha, Bandolo"- 1973) e da venda em larga escala alcançada por "Gita"(1974).

Se "Novo Aeon" pareceu ocultista e cabeça demais pros iniciantes dos anos 1970, "Há 10 Mil Anos Atrás" trazia o nascido no fim da segunda grande guerra, Raul Seixas, mais básico e simples no cantar (pequena volta ao Folk e Rock das antigas) e mais direto e cotidiano nas abordagens temáticas, mas nunca raso ou previsível; continuava tentando levar seu público, fiel ou transitório, além do que se espera para uma grande massa de populares consumidores de cultura.

Em 1976, ano de Ernesto Geisel e das mortes, um tanto estranhas, dos reformadores Juscelino Kubitschek e João Goulart, o marido de Glória Vaquer, ainda em parceria com Paulo Coelho, abre o mundo novo com "Canto Para Minha Morte" originalíssima ideia em que o eu-lírico se derrama em sentimentos antagônicos e dispersos por aquela única que será só sua, sem aviso prévio: a morte. A letra da canção é genial desde o princípio, mostrando que o eu-lirico nunca é o mesmo a cada passo ou passagem do tempo, há pequenas mortes que o acompanham; e vai destrinchando o assunto, colocando a imprevista data da grande chegada daquela de quem ninguém pode fugir, em contraponto com todas as futilidades a que tanto damos importância em nossa breve e medíocre vida, e que serão interrompidas por esta que nos separa do que, em vida, somos e temos.

"Será que ela vai deixar eu acabar o que eu tenho que fazer?
Ou será que ela vai me pegar no meio do copo de uísque?
Na música que eu deixei pra compor amanhã?
Será que ela vai esperar eu apagar o cigarro no cinzeiro?"
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 

Realmente, trivialidades importantíssimas pra que a derradeira tenha a paciência de esperar o fim.

E assume, depois, quem é que possui verdadeira importância "Vou te encontrar, vestida de cetim", e quem é que deve esperar por quem "Eu te amo e te detesto, morte, que talvez seja o segredo desta vida"; tudo cantado, e declamado, no tom mais trágico e dramático possível pra um baiano da década de 1940, adepto do Rock e fã do Baião de Luiz Gonzaga.

Então, numa segunda dose sem gelo, ele desce com o Folk "Amigo Pedro", em que são colocados os dois pontos de vista de antigos e , antes, inseparáveis amigos, que agora se antagonizam: o eu-lírico e "Pedro". Canção composta e  gravada por volta dos 30 anos do autor, parece tão saudosista, e realmente madura, que, sendo gravada no fim da carreira, ninguém duviadaria ser uma obra original de um sessentão, caso tivesse vivido tanto.

Na canção, o eu-lírico se põe como a parte que escolheu o novo, o caótico, o imprevisível, o festivo... contra aquele, o "Amigo Pedro", que disso tudo abriu mão, numa parte do caminho, em favor da segurança, do bem estar, da certeza e da clareza dos sentidos; fato que provoca muita piedade naquele que possui a voz na canção: "Pedro, onde você vai eu também vou, é que tudo acaba onde começou". Percepção agudíssima, só alcançável por quem encontrava nos discos de Rock e livros de filosofia o que lhe era negado na escola, que tanto o depreciou.


Mas nem sempre a briga ou o beijo nos salva: em "Ave Maria da Rua", o amigo velho de guerra de um famoso mago, com quem compôs a canção do disco que poria fim à parceria tão cultuada, transfere sua revolta pra uma forma de oração de um certo desvalido para uma "mãe" que conhece os enjeitados. Na canção, o eu-lírico se desmancha em preces a uma mulher que engloba, que "encarna" todas as mulheres nela, às da rua e às do altar.


"Teu nome é Yemanjá
E é Virgem Maria
É Glória e é Cecília
Na noite fria
Oh, minha mãe
Minha filha tu és qualquer mulher
Mulher em qualquer dia"
 (SEIXAS, Raul - Há 10 Anos Atrás 
    Philips; Rio de Janeiro, 1976) 


Aliás, penso ser esta a grande sacada da canção: mostrar a mulher como um ser universal, que, estando onde estiver, estando na função ou na obrigação que lhe couber, é sempre aquela que vela por quem sofre, por quem teme, por quem quer, mas não é atendido. A canção começa com uma certa calma, como quem tem certeza de que sabe exatamente que busca conforto no lugar certo, e vai tomando corpo e voz, se avolumando na instrumentação e no drama emprestado por Raul ao cantar, como se, mesmo sabendo que teria o conforto buscado, tivesse que demonstrar sua precisão e confiança com toda força que pudesse dispensar. É a melhor canção de amor feita por este fã de Elvis, e sabemos que ele não era muito assertivo ao tentar cantar pras mulheres.

Mas então, depois dessa pequena fuga, ele volta ao tema social (ou antissocial). "Quando Você Crescer" traz a principal das angústias de Raulzito, e dos que passaram pelos anos 1960 e 1970: a falta de escolha e oportunidade de completude na sociedade cristã capitalista. Ao mesmo tempo em que pergunta "O que é que você vai ser quando você crescer?" (retórica impecável), logo responde, mostrando que, na verdade, tudo já foi escolhido pra todos, pra quem segue e pra quem desassossega:


"O que que você quer ser quando você crescer?
Aguma coisa importante?
Um cara muito brilhante?
Quando você crescer?
Não adianta, perguntas não valem nada
É sempre a mesma jogada
Um emprego e uma namorada
Quando você crescer?"
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 
A ironia ácida e eficaz é clara na canção , o tom preferido do compositor, e de seus ouvintes, inclusive deste que vos escreve; essa falta de liberdade de escolha é tema recorrente nas letras e nas ideias do cantor, anarquista de carteirinha e caótico por natureza. Em seu "Baú do Raul", cita tal preocupação mais de uma vez ao explicar sua ânsia por uma sociedade alternativa. Se, por uma acaso, alguém aí ainda não havia pensado no assunto, ouvir essa música é a melhor oportunidade pra iniciar tal reflexão.

No "Dia da Saudade" (Raul Seixas e Jay Vaquer) tudo vai passar e começar diferente... mais uma vez o tom anárquico, algo que conhecemos hoje como um belo "foda-se", toma conta do texto e do tom: celebrar por celebrar, no canto que for, com a pessoa que vier. Nunca é possível se arrepender ao escolher essa e outras canções do maluco beleza no fim do dia de uma semana pra lá de estressante; muito recomendável.

E é gol, de letra! "Eu também Vou Reclamar" (Raul Seixas), clássico dos clássicos, faz a mais lúcida descrição do cenário do Pop brasuca daqueles idos de 76: cheio de referências a muitas das canções de sucesso daquela época (para iniciados), o agora menestrel reclama das canções que se diziam de "protesto" que, segundo Raul, faziam parte de uma tendência de mercado da qual ele já estava calejado e que ele mesmo havia iniciado, mas apanhava por causa disso em vez de enriquecer, ao contrário da nova geração. Depois de dizer, na letra, que também iria reclamar, pra dar uma aula de protestos, entre uma e outra questão social, política e filosófica, protesta mesmo é contra as novas canções de protesto que, pra ele, não o levaria (nem a ninguém) além das "nuvens passageiras", algo que ele não estava mesmo interessado em ser, nem muito menos "apenas o cantor". Como seria essa canção feita para os dias hoje feita por um Raul sobrevivente ou renascido?


"E sendo nuvem passageira
Não me leva nem à beira
Disso tudo
Que eu quero chegar
-E fim de papo!"
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 

Depois de tanto lutar e reclamar, o compositor de "As Minas do Rei Salomão" só quer agora mesmo é um bom incenso e uma ótima companhia pra descontrair. As riffs e batidas secas e pesadas dão clima de urgência do eu-lírico que não pretende ter nesse momento nada mais que "amor":

"Entra, vem correndo para mim
Meu princípio já chegou ao fim
E o que me resta agora é o seu amor"
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 
A letra é um desabafo claro contra a luta diária e paternalista do homem contra o homem a favor do homem; essa angústia parece tão intensa para o eu-lírico da canção, que, além de desejos de prazeres carnais e sensoriais, chega a querer vestir-se com um símbolo conhecido da feminilidade (e da realeza) que o próprio teria dado àquela que o visita "E me empresta o seu colar / Que um dia eu fui buscar / Na tumba de um sábio faraó". Parece, neste momento de encontro e busca, que não há nada mais importante para o eu-lírico do que aquela que chega com extravagâncias fora do comum, e, por conseguinte, do que ele próprio, o desfrutador. A batalha, que por ventura ainda possa precisar este que canta, não tem mais importância nem precisão neste breve momento de alívio.


"Do passado me esqueci
No presente me perdi
Se chamarem, diga que eu saí"

(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 


Depois da brabeza absoluta do macho baiano querendo prazer e delícia com sua fêmea favorita, como se renovado por essa força estranha que cerca o gênero feminino, mais calmo e decidido, o compositor, em “O Homem”, dá uma guinada no andamento e no tema pra reafirmar nesta o princípio do LP: “Eu vou tirar/Meu pé da estrada/E vou entrar também/Nessa jogada/E vamos ver agora/Quem é que vai güentá”, ou seja, Raul estava já na estrada do rock e do protesto há tanto tempo que não era hora ainda de abandonar o que ele mesmo havia construído. Num primor de casamento entre letra e música, “O Homem” começa muito lenta e calmamente como alguém que passa a explicar seus motivos, guinando depois para um grande estranhamento unindo sua voz esganiçada com o agudo de um contrabaixo, ambos dissonantes da tonalidade do trecho, pra dizer que seu “canto” “não presta” e que, por isso e assim mesmo, resolveu ficar e continuar com quem está e com quem virá a partir dele.

“Esse meu canto que não presta
Que tanta gente então detesta
Mas isso é tudo o que me resta
Nessa festa, nessa festa...”

(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 


A canção em si parece uma outra reafirmação do tema recorrente de 'esse é meu lugar e ninguém me tira daqui', tão recorrente nas canções de Raul Seixas: “A Mosca”, “Let me sing”, “Al Capone”, “Rock do Diabo”, entre outras. Como se o compositor tivesse plena consciência de suas fragilidades: baiano no American Way Life, voz esganiçada, roqueiro amante de Luiz Gonzaga, botequeiro intelectual, leitor mulherengo, pai boêmio e, mais que tudo, livre pensador falante da Língua Portuguesa da América Latina. Tudo parece atrapalhar bastante o moço de Salvador que decide ser cantor.

Todavia, isso tudo também pode ser reinterpretado, quase com os mesmo argumentos e quase nas mesmas condições, como uma bela canção de amor a uma mulher, afinal, se trata d“O Homem” dizendo de como continuará seu amor na cama e com seus filhos.

“Eu...
(vou ferver)
Como que um vulcão em chamas, como a tua cama que me faz tremer...
(...)
(vou viver)
Vou poder contar meus filhos, caminhar nos trilhos, isso é pra valer...”

(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 


Mas, com certeza, se trata de uma canção a respeito da esperança no futuro, esperança de quem não sabe bem o que virá, mas que sente que será renovador pra todos.

“Pois se uma estrela há de brilhar
Outra então tem que se apagar
Quero estar vivo para ver
O sol nascer, o sol nascer, o sol nascer...”
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 


Mas, “só pra variar”, Raul Seixas, depois de tanto reclamar, duvidar, procurar abrigo e prazer e decidir ficar (em casa), retado, volta pro início de tudo: o Mistério e o Baião. A parceria, mais uma vez certeira, com seu amigo mago é digna de todo prêmio que levar em conta originalidade e relevância cultural. Por que originalidade!?... Ora, quem mais, em 76, desafiaria o estabelecido, cantando, na grande mídia, um Baião bem ao estilo do ‘Veio Lua'? No campo do intelectual, na área do Rock’n’Roll, no universo filosófico...  não caberia um ‘Rastapé’, a não ser em se tratando de Raul Seixas como cantor. E por que relevância cultural!?... Ora, quem mais poderia combater a ditadura dos milicos, do capital, da moral, do racional, do acadêmico... senão Raul com Paulo, falando em coincidências tão obvias e que ninguém antes ainda percebera; pois veja, se toda gente não percebe coisa tão óbvia, como poderiam lhe dizer o que seria assim e o que seria assado? Pois veja, se ninguém é capaz de explicar essas estranhas coincidência, como poderia alguém tentar lhe explicar algo já bem conhecido? Pois veja, se Raul e Paulo já haviam se intrigado com tamanha força, quem pode garantir que já não soubessem sua causa e suas consequências, e, por isso mesmo, já conhecedores do cerne de toda gente, portanto, impossível de serem manipulados?

O tom da canção é claramente irônico e sapiencial, ou seja, o eu-lírico demonstra as coincidências, humanas e naturais, com relação aos números como se isso fosse já uma coisa muito conhecida e comprovada por este em comparação com ouvinte, que, caso não se cuide, será devorado por tais números ou por aquele que lhes conhece do “princípio ao fim”.



“- Pra encerrar
Eu falei de tanto número, talvez esqueci algum,
Mas as coisas que eu disse não são lá muito comum,
Quem souber que conte outra, ou que fique sem nenhum”

(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 
O ritmo é empolgante e a letra precisa se encaixa feito luva no andamento e na melodia. Vale a pena uma audição mais atenta, caso ainda não tenha feito isso.

Só que, logo em seguida, Raul Seixas dá nova guinada no ritmo do disco, dessa vez com “Cantiga de Ninar”, que provavelmente deve ter sido composta em homenagem à sua segunda filha recém-nascida de sua segunda esposa. É a canção com o andamento mais lento do LP, talvez uma das mais lentas do compositor, como se essa fosse a única forma de “frear” o autor em suas ambições espirituais e sociais: a mágica do amor e da vida renascendo na forma de uma menina (Raul foi pai de três com três esposas). 

Mais do que uma homenagem, na verdade, a bela letra parece uma forma de religação com o homem antes do homem: o homem que dorme sem esperar, pois não tem planos;

“Nada tão belo como uma criança dormindo
Nem tão profundo como dormir sem sonhar
Nem tão antigo como o sonho dos teus olhos
Nem tão distante como a hora de acordar”
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 

o homem sem angústia, pois sua realidade é aquilo que canta;
“Dorme enquanto teu pai faz músicas
Que é a forma dele rezar
Todos os sonhos na realidade
São verdades, se eu puder cantar”
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 
o homem que não se preocupa, pois, quando precisa, tem;

“Você chora quando tem fome
Mas vem logo uma mamadeira
Amanhã se você chorar
Vai chorar tua vida inteira”
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976)  
o homem que não anseia, posto que é e também está.

“Fiz meu rumo por essa terra
Entre o fogo que o amor consome
Eu lutei mas perdi a guerra
Eu só posso te dar meu nome”
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976)  
Assim, se religou ao princípio.

E pra confirmar sua inovação, e verdadeira contracultura, Raul Seixas, contrariando o esquema de mercado, a expectativa do consumidor, e, acima de tudo, a lógica dos músicos popularescos, coloca a faixa título do disco “Eu nasci há 10 Mil Anos Atrás” como a última do Lado B, a que vai fechar o produto, quer dizer, genialmente o compositor lança uma proposta no título do LP “Há 10 Mil Anos Atrás”, depois vai articulando as canções de modo que, coerentemente, levem o ouvinte a entender sua conclusão “Eu nasci há de mil anos atrás/e não tem nada nesse mundo que eu não saiba demais”, ou seja, não há nada que se diga ou que se faça que ele, o eu-lírico, já não tenha ouvido ou visto antes. Como praticar o engodo com alguém como este que canta no disco?

Em resumo, Raul Seixas, a seu entender, tinha como principal objetivo, através desse disco, talvez também dos demais, liderar a gente que o compreendesse pra algo novo, algo que não seria político, social, profano, santo, artificial ou natural, mas algo lógico, vindo de alguém que já conheceria todos os caminhos e direções possíveis, e impossíveis.

Alguém se dispõe?
-"Um dia, numa rua da cidade
Eu vi um velhinho
Sentado na calçada
Com uma cuia de esmola
E uma viola na mão
O povo parou para ouvir
Ele agradeceu as moedas
E cantou essa música
Que contava uma história
Que era mais ou menos assim:"
Eu nasci 
Há dez mil anos atrás!
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...
Eu vi Cristo ser crucificado
O amor nascer e ser assassinado
Eu vi as bruxas pegando fogo
Pra pagarem seus pecados
Eu vi!...
Eu vi Moisés
Cruzar o Mar Vermelho
Vi Maomé
Cair na terra de joelhos
Eu vi Pedro negar Cristo
Por três vezes
Diante do espelho
Eu vi!...
Eu nasci 
Há dez mil anos atrás!
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...
Eu vi as velas
Se acenderem para o Papa
Vi Babilônia
Ser riscada no mapa
Vi Conde Drácula
Sugando sangue novo
E se escondendo atrás da capa
Eu vi!...
Eu vi a arca de Noé
Cruzar os mares
Vi Salomão cantar
Seus salmos pelos ares
Eu vi Zumbi fugir
Com os negros prá floresta
Pro Quilombo dos Palmares
Eu vi!...
Eu nasci 
Há dez mil anos atrás!
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...
Eu vi o sangue
Que corria da montanha
Quando Hitler
Chamou toda Alemanha
Vi o soldado
Que sonhava com a amada
Numa cama de campanha
Eu li!
Ei li os símbolos
Sagrados de umbanda
Eu fui criança pra
Poder dançar ciranda
Quando todos
Praguejavam contra o frio
Eu fiz a cama na varanda...
Eu nasci 
Há dez mil anos atrás!
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...
Não! Não!
Eu tava junto
Com os macacos na caverna
Eu bebi vinho
Com as mulheres na taberna
E quando a pedra
Despencou da ribanceira
Eu também quebrei a perna
Eu também...
Eu fui testemunha
Do amor de Rapunzel
Eu vi a estrela de Davi
Brilhar no céu
E para aquele que provar
Que eu tô mentindo
Eu tiro o meu chapéu...
Eu nasci 
Há dez mil anos atrás!
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...
(SEIXAS, Raul - Há 10 Mil Anos Atrás -
Philips; Rio de Janeiro, 1976) 

REFERÊNCIAS

Terra

Wikipedia

Discografia

You Tube

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